#003 - Não se perca novamente

Sobre o que aprendi em 2023

Não se perca novamente

Eu tive um diário que acabei apagando em 2023 num surto de raiva, estresse e depressão. Ele tinha, no final, na última página, essa frase do título.

Não se perca novamente. Essa era a mensagem mais importante que eu tinha para relembrar…

O motivo: parecia que eu estava sempre vivendo em fazes de cegueira/clareza que se alternavam, e eu não sabia qual era o "botão” que desligava a cegueira.

A cegueira, assim como na obra de Saramago, era branca: era feita de excessos. Era tudo ao mesmo tempo. Irônico que eu estava morando em uma avenida extremamente barulhenta - o que ilustrava total e absolutamente o que estava acontecendo dentro de mim.

Fora e dentro eram a mesma coisa: caos.

Foto minha com Miguel no lugar que eu adorava e que depois perdeu todo brilho junto com quase tudo por conta da depressão, TAG e Pânico…


A vida é um longo teste de Qi, ouvi dizer recentemente.

Até concordo. Ainda mais daqui para a frente, já que a inteligência humana, uma das forças mais brutais que existem, foi copiada e inserida em aos não humanos.

Dominamos o fogo e isso foi uma revolução.

Dominamos a informação com a escrita e isso foi uma revolução.

Agora o fogo da inteligência foi dominado. O Prometheus da vida real.

O mundo precisará de cada vez mais inteligência, velocidade, sabedoria, intuição e profundidade humana.

E o que mais me dá medo não é o fato de que as máquinas possam tomar o poder, ou se tornarem uma SKYNET, ou adquirirem consciência, nem nada disso - acho isso tudo muito absurdo em 99% das vezes que ouço ou leio sobre. Parece que o real perigo da IA é quase sempre ignorado diante do imaginário que os filmes criaram nas pessoas.

Meu maior medo é que o ser humano se perca de si mesmo dentro dessa força centrífuga da velocidade, da exponencialidade tecnológica, do mar de conteúdo inútil.

Meu maior medo é perdemos a essência por conta da velocidade, assim como acontece quando você não consegue mais ver os detalhes da estrada, pela janela do ônibus, quando ele acelera muito.

Meu maior medo é perdermos nossa essência, e perdermos ela para uma cópia da nossa inteligência.

Meu maior medo é a IA fazer tudo que não faz sentido pra mim num tempo em que eu não sei mais o que FAZ sentido para mim.

Perder nossa essência pelas mãos da nossa maior força. Que ironia!

O mundo estará cada vez mais persuasivo em te deixar dopado, silenciado, em te tornar só mais um éco. Por isso eu sempre digo que você tem que ser uma voz e não um eco.

Os ecos dominarão em número.

Os ecos serão mais velozes.

Os ecos serão, como sempre foram, hegemônicos.

E as vozes serão escassas como sempre foram, mas desta vez jogadas num mar de barulho, de ruído, de confusão, de excesso.

E qual o problema disso?

A história humana não é isenta de catástrofes causadas pela nossa cegueira.

Eu diria que a história humana é em grande parte marcada por momentos breves de lucidez que são conquistados após momentos intensos de cegueira.

Uma vez, quando estudava mindfulness e me precoupava por não estar treinando todo dia, li uma passagem bastante estranha de um dos pais divulgadores do mindfulness no ocidente, Jon Kabbat Zinn. Dizia ele que, em muitas ocasiões, não treinar atenção plena era uma das melhores formas de conquistar um estado intenso de atenção plena. Por que? Por que estar cego, não perceber o que é importante é uma das formas mais eficazes de aprender a ver com clareza, por conta da imensa dor que isso causa.

Voltando ao QI.

Tem um problema com essa ideia de a vida ser um teste de QI.

O problema nem está em saber se os desafios da vida medem ou não medem capacidades mentais - pois acho que a longo prazo medem, e medem muito bem, os estudos sobre isso são muito claros - mas o problema está em saber o que se faz com essas capacidades mentais.

O problema está em como fazer sua MENTE não te tirar do caminho da sua ALMA. 

Deixe-me explicar melhor.

Tive dois grandes choques na vida: o primeiro choque foi entender o funcionamento da inteligência, e ver como ela impacta na vida de alguém, perceber que eu era uma pessoa com inteligência acima da média, ao contrário do que minhas emoções apontavam.

O segundo choque foi perceber que a inteligência, por si só, mesmo sendo uma das forças mais imponentes da natureza, não faz nada sozinha.

Uma frase que ouvi e que carrego comigo sempre é: inteligência não tem absolutamente nada a ver com sabedoria.

Demorei uns bons meses para entender essa frase.

E por isso chego agora ao título desse texto.

Não se perca novamente!

Esse é um recado para meu eu de 2024, para você, para todos.

No ano de 2023 eu me perdi várias vezes de mim. Foram muitos diagnósticos psiquiátricos, muitos medicamentos errados, muitas decisões péssimas que quase me destruíram.

Minhas forças estiveram no fim em vários momentos. Minha esperança esteve apagada por vários meses e não fosse Dani e Miguel eu não teria conseguido sair disso como saí.

Mas o fato é que eu estive cego por muito, muito tempo neste ano.

Minha mente estava cega.

Meu corpo estava cego.

Todo o meu ser estava cego a tudo que importava. E o pior: estava também cego ao que não importava.

Quando você está desesperado, com depressão, TAG, pânico, e dopado com vários medicamentos, com um filho pequeno, numa cidade pequena, num apartamento o qual não pode sair por que não tem como pagar outro e que atormenta sua mente com um barulho enlouquecedor 24h por dia, e com uma imensa responsabilidade que não escolheu carregar, e que sente inclusive que não é capaz de suportar, ainda mais com pessoas te criticando como se você fosse um monstro, você perde totalmente a capacidade de dicernir o que é essencial do que é inócuo.

Encontrei nas notas um texto da época:

“Vontade zero de sair da cama. 

Sair pra que de tenho que voltar depois? 

Sair pra que se está um frio danado lá fora? 

Se com toda certeza vou acabar o dia frustrado e me culpando por não fazer o que eu me propus a fazer. Ou não conseguir me concentrar por conta do barulho lá fora ou por causa da dor nas costas da cadeira. Comprar uma cadeira boa pra que se eu vou sentar nela pra fazer planos que nunca cumprirei? Colocar uma cortina naquela parede que tem uma vista feia para que se vou me mudar daqui em breve? Tomar banho para que se eu vou ter que tomar de novo amanhã, e depois de amanhã interminavelmente? Fazer comida pra que se tenho que lavar toda louça depois. Mesmo com a máquina de lavar, que tenho todo trabalho de colocar coisas nela e tirar. 

Por que todo dia precisa ser esse martírio dentro de mim? Essa luta de mim contra mim mesmo, na qual sempre me derroto? Por que todo dia tem que ser um acúmulo de coisas a fazer em vez de coisas feitas - e bem feitas? Por que quanto mais eu sento pra eliminar tarefas, mais elas brotam umas das outras? Por que nunca consigo desligar a mente que trabalha e ligar a mente que aprecia o trabalho? “

***

Cada ponto de sujeira no chão parecia estar atacando minha alma. Cada e-mail não lido atestava mais minha incompetência.

Mas sabe o que eu aprendi de mais curioso: Tudo isso só acontece se você estiver longe da sua essência!

Quando você sabe exatamente quem você é, o que deve fazer, onde deve estar, você resiste a qualquer força contrária, a qualquer manada, qualquer injustiça, qualquer mal.

A clareza impede em grande parte que o sofrimento se torne sem sentido, e é somente quando ele não tem sentido que ele se torna patológico.

O que importa realmente?

As pessoas fazem tatuagens para se lembrar do que importa, tiram fotos, pintam a casa, se vestem de determinada forma.

Mas a forma mais intensa de aprender ainda é a mesma de sempre: a dor. E a sua vida é também em grande parte marcada por momentos breves de lucidez que são conquistados após momentos intensos de cegueira, dor e erro.

Espero que o ano de 2024 seja um ano de clareza para você. Que você consiga ver o aprendizado por trás de toda dor. Que voc6e consiga errar e não brigar com isso.

E para isso, eu acho que o caminho será o de reduzir ruídos ao máximo.

Por isso eu estou fora do instagram desde o dia 6, o dia de abertura da Academia Da Vinci.

Se quiser, te convido a embarcar numa aventura, junto com mais de 900 pessoas, na Academia Da Vinci. Nossas “portas digitais” estão sempre abertas aos espíritos profundos.

E não esqueça: se você se encontrar no meio da loucura que a vida é, não se perca novamente. 

Recomendações:

Soul to Squeeze - Música que ouvi muitas vezes quanto me curava de uma relação abslutamente patológica em 2021, e que curiosamente tem uma letra que casava perfeitamente com o que eu estava vivendo e curando - https://www.youtube.com/watch?v=Net5L--8L1— .

Explicação bastante espiritual de Stairway to Heaven - Vídeo sobre uma das músicas que mais ouvi na vida, e que explica a letra de uma forma extremamente inteligente e sábia - https://youtu.be/z2efoJdozJY?si=bzkAyVmReA8jrN04

Essa parte é destruidoramente profunda:

And as we wind on down the road

Our shadows taller than our soul

There walks a lady we all know

Who shines white light and wants to show

How everything still turns to gold

And if you listen very hard

The tune will come to you, at last

When all are one and one is one

To be a rock, and not to roll < medite uns meses sobre o significado desta frase.

Lacrimosa - Música que ouvi enquanto escrevia esse texto. Ela faz o mundo parecer bizarro, lindo e assustador, tudo ao mesmo tempo. E se você fizer a experiência de ver um pássaro voando, uma mulher andando na rua, uma criança brincando ou qualquer cena trivial, essa música fará paracer que você está vendo um filme. https://www.youtube.com/watch?v=k1-TrAvp_xs

Academia Da Vinci - Nem sei muito bem o que é isso ou o que vai se tornar, mas como disse Thiago, um membro da Academia, ela já nem é mais minha: é dos membros. - https://academiadavinci.com.br/

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